sexta-feira, 15 de novembro de 2019

Críticas

Há algum tempo tem havido um movimento mundial para a promoção da crítica. Esse movimento pretende que a crítica faça parte do cotidiano das pessoas no mundo todo. Há, por exemplo, um braço filosófico, chamada filosofia crítica, e principalmente na educação, com diversas denominações. Embora louváveis algumas dessas iniciativas, é preciso muita cautela pelos impactos negativos que a maioria delas gera. Toda crítica é um veneno.

Pegue qualquer texto ou preste atenção ao discurso das pessoas que se dizem críticas. Pelo menos uma de três coisas serão percebidas. A primeira é o esforço de encontrar erros nos trabalhos e feitos dos outros. Neste particular, todo crítico é incapaz de perceber e compreender que o ser humano é imperfeito. Por mais genial que possa parecer, como nas obras de arte, tais como Michelangelo e Mozart, há sempre a possibilidade de se encontrar falhas, erros nelas.

Os críticos são incapazes de perceber a imperfeição na prática e no raciocínio. Tanto é que obras formidáveis são erigidas desconsiderando essa singela constatação. Exigem dos outros a perfeição que ninguém é capaz de alcançar. E não percebem o outro lado da crítica. Quem critica dá a impressão de que sabe mais do que o que fez o ato falho. E age como tal. Ora, se o crítico é tão genial assim, por que não faz perfeito o que considera falho? Vejamos alguns exemplos.

Há quem diga que Neymar é isso ou aquilo. Tudo bem, aceitemos por enquanto a crítica. Mas o crítico que o faz tem que ser capaz de jogar futebol tão bem ou melhor do que Neymar, em primeiro lugar, e, depois, agir com a retidão que exige do jogador. Isso o crítico não percebe: precisa ser capaz de colocar na prática aquilo que exige do outro. Se não fizer isso, é hipocrisia o que faz.

A segunda coisa é a inveja que está por trás de toda crítica. A inveja é aquela vontade inconsciente de ser ou fazer o que denuncia. Quando alguém diz que fulano é feio, no fundo quer ser fulano. Se outro diz que beltrano faz coisas reprováveis, muito provavelmente também gostaria de fazer. Quase tudo inconscientemente. É que o discurso diz coisas que não falamos. Ou falamos nas entrelinhas.

A inveja é um veneno que corrói o corpo, a mente e a sociedade. Quando ela está presente, provoca a produção de hormônios nocivos ao corpo, envenenando-o, matando-o aos poucos. E se o alvo da inveja se incomodar com ela, o mesmo efeito lhe é produzido, envenenando-o também. A razão disso é que a mente, que faz parte do corpo espiritual do invejoso, está doente. E a doença penetra no corpo, contaminando-o. Quanto mais pessoas se contaminarem com os efeitos do ato invejoso, a doença passa a fazer parte do corpo da sociedade, matando-a aos poucos.

Fica fácil compreender que todo crítico deseja ser o que critica. Portanto, a terceira coisa que o crítico não percebe é seu desejo de fazer o que denuncia. Isso significa que todo crítico é um incapaz. É alguém que torna pública a sua incapacidade de fazer. Como não sabe fazer, denuncia, critica.

Como superar a crítica? Há duas possibilidades, pelo menos. Para o que gosta de criticar, aprender. Todo crítico é carente de saber, entendido o saber como a) compreender a lógica das coisas, b) saber manusear a lógica das coisas e c) agir sempre em conformidade com a lógica da coisa. Vejamos alguns exemplos.

Se digo que Neymar deveria agir de determinada forma, primeiro devo aprender a jogar futebol tão bem quanto ele para galgar a fama que ele auferiu para experimentar a ação criticada no jogador. Aqui temos as três coisas a) entender a lógica de como jogar futebol tão bem quanto Neymar, b) saber jogar futebol tão bem quanto Neymar e agir da forma como eu critiquei e c) agir sempre da forma como eu critiquei, sabendo jogar futebol tão bem quanto Neymar.

Alguém poderá argumentar que o que foi criticado foi o fato de Neymar ser desrespeitoso com a imprensa. Sim, é verdade. Mas o desrespeito é consequência da fama extrema do jogador, que por sua vez é decorrente da sua brilhante habilidade de jogar futebol e que essa habilidade se mantém constante. Enquanto o brilhantismo se mantiver, provavelmente a fama se manterá e, não tão provavelmente assim, o desrespeito poderá se perpetuar.

A segunda coisa é em relação ao criticado. Jamais revidar. Jamais agir como crítico. Crítica é veneno. Como o crítico tem visão e interpretação limitadas, não se lhe deve dar ouvidos. Se a ação criticada foi com intenção do bem, continue a agir assim; se não o foi, corrija-a. Neste último caso, o crítico se lhe foi de alguma utilidade. Mas não se deixe influenciar por ele. Ele quer, inconscientemente, lhe envenenar porque ele lhe inveja.

A mente e a atitude dos críticos estão voltados para a destruição. Agindo assim, muitos até de boa vontade, acreditam que estejam contribuindo para melhorar as coisas. Suas habilidades estão voltadas para o ruim, que é o que lhes predomina interiormente, jamais para o bem. Se virem mil coisas boas e uma ruim, seus olhos captarão apenas o que é ruim, deixando de lado as mil outras. Por isso os críticos jamais serão sábios.

Para transformar qualquer crítico em pessoa normal, é necessário que sigam o caminho do saber. Primeiro precisam aprender a lógica das coisas que criticam, porque não a conhecem. Só criticam porque não sabem como ela funciona. Segundo, precisam aprender a prática dessa lógica. Geralmente o crítico tem ódio do fazer, do praticar, sem perceber que sem saber fazer não há saber. E terceiro, é preciso agir em conformidade com a lógica da coisa que se aprendeu a colocar em prática.

Todas as pessoas que fazem esse percurso deixam de ser críticas. E se transformam em pessoas normais. Se aprender mais um pouco sobre a lógica das coisas e do mundo, a pessoa vai se enchendo de amor por tudo o que aprende, deixando a crítica no passado distante. Passa a se amar e amar aos outros. O aprofundamento no saber pode lhe levar à sapiência. O sábio é aquele que percebe as inconsistências das coisas e, amorosamente, que aprendeu no estágio anterior, ensina a caminhar pelo exemplo. O sábio é aquele que faz o que fala. O crítico é aquele que fala do que não sabe fazer e se engana, pensando que sabe do que fala.

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