sexta-feira, 15 de maio de 2020

Dois Conceitos Intrigantes

Todo campo do conhecimento científico é estruturado em conceitos. Os conceitos são espécies de unidades básicas de retratação da realidade. São como os quarks para o mundo físico-químico: formam todos elementos dos átomos, que se agrupam em moléculas e que a cada agrupamento vão formando tudo o que tem e o que não tem vida. No campo da Administração, dois conceitos parecem ser fundamentais na atualidade: unidade de comando e unidade de direção.

A chave para a compreensão desses conceitos é a palavra unidade. Mas, antes, é necessário que se entenda o que é uma organização, uma vez que a ideia de unidade só tem sentido sob a perspectiva organizacional. Uma organização é todo agrupamento humano que tem pelo menos um objetivo em comum. Isso quer dizer que toda vez que duas ou mais pessoas decidem, negociam entre elas, fazer alguma coisa, essa alguma coisa é o objetivo que elas passam a ter em comum.

O objetivo em comum, ao mesmo tempo em que forma a organização, também dá sentido à somatória dos esforços das pessoas que a compõem. Na prática, tudo o que cada pessoa que faz parte da organização só deve fazer coisas que levem ao alcance do objetivo pretendido. Se uma ou mais pessoas passarem a fazer coisas que pouco ou nada têm a ver com o objetivo, pouco a pouco a organização vai se desfazendo a desaparecer por completo.

É o objetivo a ser perseguido, portanto, que faz com que as pessoas se unam e criem as organizações. Também é ele que, quando alcançado, desfaz as organizações. Também é ele que, quando as pessoas se recusam a persegui-lo, justificam a retirada dos membros da organização. Dessa forma, o objetivo é o que promove a organização, a sua unidade. Pessoas devem perseguir os mesmos objetivos. Essa é a ideia primária de unidade em gestão.

Unidade de comando é o acordo que as pessoas fazem, quando aceitam fazer parte de uma organização, de obedecer ao seu superior. E apenas a ele. O indivíduo que trabalha em uma loja como vendedor precisa obedecer ao seu chefe, o gerente de vendas porque está subordinado a ele. Se ele obedecer ao gerente de marketing, estará criando uma confusão muito grande e corre o risco de ser considerado insubordinado, porque isso é insubordinação ao seu chefe imediato.

O gerente de vendas, assim como o gerente de marketing, estão subordinados ao gerente geral, que comanda toda a loja. Os dois gerentes (de marketing e de vendas) lhe devem obediência. E essa obediência é a unidade de comando: estão respeitando o acordo inicial de obedecer a um único comando, que é aquele do seu chefe imediato. O respeito às orientações da chefia imediata por parte de seus subordinados garante a unidade de comando, que nada mais é do que o funcionamento adequado da parte da organização a que esses subordinados fazem parte. Quem estiver no setor de vendas deve obedecer ao gerente de vendas; quem estiver no setor de marketing, ao gerente de marketing.

E, agora, uma coisa estranha. Nenhum subordinado pode obedecer a ninguém, a ninguém mesmo, que não seja seu chefe imediato. O vendedor não deve obedecer ao gerente de marketing, nem ao gerente geral, nem ao superintendente da cadeia de lojas e muito menos ao presidente ou dono de todas as lojas! Nem aos clientes, nem ao governo, enfim, a ninguém. Se obedecer a outra pessoa que não seja seu chefe, quebrou a cadeia de comando, quebrou a organização.

Unidade de direção é simples: todos devem mirar o mesmo objetivo. Como vimos, é o objetivo que fundamenta a existência de uma organização. Sem um objetivo, nenhum motivo há para que as pessoas se organizem e se unam. A ideia de unidade de direção é fácil de entender: todos devem caminhar para a mesma direção. Nada de um querer fazer uma coisa e outro outra coisa. O que um fizer tem que ajudar o outro no seu trabalho para que ambos andem para o mesmo destino desejado.

Se um vendedor quer vender mais roupas de verão, outro quer vender churrasco e um terceiro quer ficar apenas olhando as mulheres bonitas passar, não há unidade de direção. Não há, portanto, organização. E provavelmente essa empresa irá quebrar.

Se o prefeito de uma cidade quer eliminar a fome em sua cidade e o secretário de finanças quer investir em salários de aposentados, não há unidade de direção. Se o marido quer que sua família obtenha autonomia financeira em 10 anos e a esposa quer investir tudo o que ganha em um carro esportivo, também não há.

Sem a unidade de direção, o gerenciamento fica um caos. Mais do que isso, sem unidade de comando, toda a organização, pequena ou gigantesca, sente seus efeitos perversos. O que provoca a falta de unidade de comando e de direção é a insubordinação. O subordinado precisa cumprir o que foi acertado com o seu superior e só a ele dar ouvidos. Ainda que o navio esteja naufragando, é ao comandante que todos devem obedecer.

É preciso observar que ordens absurdas não se cumprem. Se o chefe mandar o servidor cometer um crime, essa ordem deve ser desconsiderada. Nesses casos, as ouvidorias organizacionais e institucionais precisam ser acionadas, para registro, para o caso de quem não ocupa posições táticas ou estratégicas. Geralmente quem está nessas posições superiores da hierarquia preferem simplesmente deixar a organização.

Unidade de comando e unidade de direção já foram estruturais nos primeiros momentos da Administração. Hoje há inúmeros formatos organizacionais que lidam com fenômenos poliárquicos, em que a hierarquia é distribuída horizontalmente (e até mesmo não existir), com pessoas recebendo ordens e obedecendo a múltiplas chefias. Mas organizações mais seculares, centradas na disciplina e rigidez relacionais, continuam nelas estruturadas, como o exército e muitas igrejas.

Quando alguém que está na posição de chefia, seja o vendedor de cachorro quente da rua ou o presidente da república, disser que seus imediatos lhe devem obediência, simplesmente está colocando em prática a unidade de comando. Quando diz que eles devem mirar o mesmo objetivo, está praticando unidade de direção. E anote essa mentalidade: se alguém desobedecer, ou será demitido ou será destituído da posição de chefia. Tirania? Talvez. Para a ciência da Administração, apenas uma forma de compreender a realidade e agir em conformidade com essa mentalidade.

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